Eu Crítico

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Remembrance of Earth’s Past

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Comecei a ler o primeiro livro da série, O Problema dos Três Corpos, em 31 de março e li em 3 dias na edição brasileira da Suma de Letras.

https://www.companhiadasletras.com.br/livro/9788556510204/o-problema-dos-tres-corpos

Os outros dois eu encarei em inglês e terminei em 15 de maio. Por três meses e meio fiquei vivendo dentro da história e gostei tanto que resolvi escrever algumas das minhas impressões sobre eles.
Se quiser saber mais sobre a história em si, recomendo o post da Sybilla
https://www.momentumsaga.com/2017/01/resenha-o-problema-dos-tres-corpos-de-cixin-liu.html

Essa série de livros do autor chinês é interessante por muitos motivos. O mais óbvio é porque a história é boa, bem desenvolvida, contém inúmeras ótimas idéias e vai agradar quem gosta de ficção científica ao estilo do Asimov ou do Clarke: aquele estilo de ficção científica que se apóia fortemente em questões de desenvolvimento tecnológico fundamentado nas teorias mais avançadas da área.
A caracterização e o desenvolvimento dos personagens acontece mas fica em segundo plano. O lado forte desta série é a evolução da tecnologia ao longo de mais de 400 anos da humanidade, à espera pela invasão por uma espécie muito mais avançada tecnologicamente. Por vezes a narrativa avança décadas ou séculos de um parágrafo para o outro e isto não incomoda, ao contrário, você quer saber mesmo é o que vai acontecer no futuro e na série o futuro chega logo quando é necessário. Outras vezes o autor se foca por muitas e muitas paginas por algo que parece ser inútil mas que ajuda a criar o clima para valorizar aquele ou aquela personagem mais à frente.

Algumas pessoas com quem conversei desanimaram da série (que começa igual ao livro embora seja beeem diferente em muitos detalhes logo depois) na primeira cena que parece ser uma crítica à China. Mas o livro começa igual: a autocrítica em relação aos excessos da Revolução Cultural faz parte da narrativa contemporânea da China e é abertamente discutida por lá já faz muito tempo.

A série me fascinou também porque faz muitas referências a outros autores sem mencioná-los diretamente. Tecnologias como o elevador espacial (proposto pelo já citado Arthur C. Clarke) formam uma parte importante da narrativa.
Tenho quase certeza que inúmeras outras referências do tipo estão dispersas pelos três livros e minha pouca erudição em ficção científica não foi capaz de captá-las.
O próprio título norte-americano da série de livros também faz uma curiosa referência ao nome em inglês da série de livros do Proust, Em Busca do Tempo Perdido que em inglês ficou Remembrance of Things Past.

Sem fazer referência direta os livros de Cixin Liu também põe em ação uma situação imaginada por Stanislaw Lem que descreve como poderia ser a comunicação entre seres avançados a ponto de conseguirem alterar as próprias leis da física. Certamente não por acaso que o nome do sistema de onde vêm os alienígenas seja TriSolaris.
Mas ao invés de uma mera comunicação, na série a relação entre civilizações é feita quase sempre em contexto de guerra seja para o ataque ou para defesa.
Fiquei pensando que talvez seja por isso mesmo que a série de um escritor chinês tenha feito sucesso no mercado norte-americano. OS Estados Unidos são uma nação com uma enorme cultura militar que permeia a cultura de modo onipresente e não precisa ir muito longe em Hollywood para perceber isto. A série chinesa descreve uma situação de guerra universal, com civilizações se eliminando umas as outras, uma verdadeira guerra nas estrelas. Para os personagens de Liu, o Universo seria uma Floresta Escura com civilizações sempre à espreita para atacar. Fico pensando o que Carl Sagan (otimista a ponto de capitanear o envio de uma sonda terrestre gritando para o Universo “Ei, estamos aqui! Somos assim!”) teria a dizer sobre essa teoria. É até possível que tenha sido confrontado com essa teoria ainda em vida. Se alguém souber de um texto de Sagan que discorra sobre o assunto, favor avisar pois eu não lembro de ter lido.
Sendo uma série de livros que descreve uma situação de guerra universal, eu provavelmente não teria ficado muito empolgado em ler se soubesse disso antes. Mas a tal guerra descrita na série é muito mais estratégica do que feita de batalhas entre naves, o que torna tudo muito mais interessante e muito pouco óbvio. Certas partes do livro são pura sociologia e antropologia futurista: especulações tanto sobre outras espécies quanto sobre a nossa própria futura civilização terrestre, caso cheguemos lá.
Além do ensaio de Stanislaw Lem, este sensacional hackeamento das leis da física para fins bélicos por civilizações suficientemente avançadas, a série também me lembrou a tetralogia Ware do escritor Rudy Rucker.
https://www.rudyrucker.com/wares/
Nesta série o autor acompanha cerca de 200 anos de desenvolvimento da tecnologia de robótica, que eu descrevi em outro post.

https://eusouocritico.wordpress.com/2013/01/09/software-wetware-freeware-realware-rudy-rucker/


No entanto são livros bastante diferentes. Recomendo ambos e creio ter ficado tão impactado pelos livros de Liu quanto pelos de Rudy Rucker.

Conclusão: é uma série de livros cabeçuda e com questões complexas de ciência avançada. Se você não gosta de acompanhar o desenvolvimento das teorias científicas você provavelmente vai se perder em vários momentos e não vai gostar.

Written by interaubis

maio 19, 2024 às 9:28 pm

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